Como me tornei bancária...
Tudo começou assim: há três anos, uma jornalista com certo talento, mas ganhando mal numa capital provinciana, com filho pequeno e contas pra pagar, resolve virar bancária. Dá-lhe terapia... decisão tomada. E cá estou eu escrevendo para tentar me sentir viva. Porque às vezes tenho a ligeira impressão de que jornalista era pessoa, bancário não. Uma máquina, um robô, uma peça substituível na linha de montagem do setor econômico mais poderoso do Brasil. Sim, trabalho praqueles que são os maiores credores do País, definidores de governos, políticas, futuros.
Muitas coisas são tão diferentes em relação à minha profissão do coração. As relações de trabalho e também a relação com o público. Desde que entrei no banco eu trabalho com público. No atendimento (aquelas mesinhas que todos pensam que são ocupadas por gerentes) era uma coisa, agora no caixa é outra. O trabalho no caixa é muito rápido e às vezes me sinto um terminal, um mero processador de documentos de crédito e débito. Isso porque ainda não se implantou uma tecnologia que substitua totalmente nossa força de trabalho (existe e está cada vez mais próxima).
Lembro quando uma cliente chegou no guichê, entregou seu cartão do banco e ficou olhando pra minha cara. Eu peguei o cartão, dei o comando de saque, pedi pra ela digitar a senha. Aí ela disse com a cara de que fosse óbvio: “não quero sacar, quero depositar”. Cara, o ser humano é muito doido, rsrs.
No atendimento era diferente. Uma pessoa entra na agência pra conversar com o “gerente” por dois motivos: pedir ou xingar. Eu não me importava muito com cliente bravo – eu entendo perfeitamente, porque antes de ser bancária eu só entrava em agência para reclamar. Raramente eu passava da sala de autoatendimento. Porém, uma das coisas que me desgastam emocionalmente é ver o cliente endividado, precisando de dinheiro. Esse vai às nossas mesas desesperado, humilhado, triste. Já vi pai de família com lagrima dos olhos ao ver que não tinha mais linha de crédito no banco. Ouvi a senhora, auxiliar de cantina, implorar pra liberar o 13º salário que empréstimo havia engolido... Presenciei, com dor, o endividamento das famílias crescer e proporcionar muito lucro aos bancos.
Mesmo assim, eu era minimamente humana ali, as pessoas precisavam dos meus ouvidos pra desabafar, ou das minhas orientações para se salvar. Agora, mexendo com dinheiros e emitindo recibos, nem isso eu sou.
(texto escrito em meados de 2014...)
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