Elegia ao meu país
Sinto que estou perdendo meu país. Em um 28 de outubro inesquecível ele me escapou das mãos. Nesse mesmo dia também me escapou um amor, mas com isso já estou acostumada. Agora, perder o próprio país é demais, mas é isso o que está acontecendo.
O Brasil está à deriva como o país da imaginação de Saramago. As coisas que acontecem são saídas de histórias fantásticas de Garcia Márquez ou lúgubres contos de Eduardo Galeano. Outras me remetem aos tempos obscuros das ditaduras latino-americanas, fatos do passado distante que recriava com os olhos românticos de adolescente.
Então de repente vejo que eu é que estava equivocada. Eu, nascida na classe média empobrecida, mas intelectualizada, que acreditava num futuro melhor e num mundo mais humano, e que as atrocidades tinham ficado num passado. Para ser mais exata, reservadas a uma classe que não era a minha. Mesmo todo o marxismo não me preparou para este momento e nem para os que virão. Admito agora que um certo evolucionismo histórico estava bem entranhado em mim, mesmo que racionalmente eu soubesse que tempos mais difíceis sempre poderiam vir. Mas agora que está aqui (e apenas no começo), me desespero.
“Não me peça que eu lhe faça uma canção como se deve
Correta, branca, suave, muito limpa, muito leve
Sons palavras são navalhas
E eu não posso contar como convém
Sem querer ferir ninguém
Mas não se preocupe meu amigo
Com as coisas que eu lhe digo
Isso é somente uma canção
A vida é realmente diferente, quer dizer,
Ao vivo é muito pior”
(Apenas um rapaz latino-americano, canção de Belchior)
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