Literatura e Consciência Negra: dicas de livros











Neste 20 de novembro, dia tão importante na luta antiracista no Brasil, vou publicar aqui sugestões de livros maravilhosos que tenho lido, escritos por autores e autoras pretas. Em séculos de opressão, exploração, colonialismo e apagamento histórico, quantas histórias deixaram de ser contadas? E quantas foram contadas, mas pouco conhecemos? E quantas ainda precisam ser escritas?

Felizmente, e apesar de tudo, a literatura negra está passando por um ótimo momento de reconhecimento e novas publicações, aqui e no mundo inteiro. Ler esses autores, reconhecer seus méritos ou deméritos, suas diversas vivências e visões de mundo, discuti-las, questioná-las, trazê-las ao espaço que merecem, é parte do combate ao racismo. Leiam!


O AVESSO DA PELE, de Jefferson Tenório

O primeiro livro que indico está entre os finalistas do Prêmio Jabuti (foi vencedor) e Oceanos de 2021. Tem como personagem principal um homem negro que escreve para seu pai morto. Nessa conversa íntima, ele resgata a infância em Porto Alegre, o descobrimento do racismo, o relacionamento com mulheres brancas, as crises do que é ser negro no Brasil (e no Sul do país). 
Recolhendo os fios de seu passado familiar, o personagem aprofunda em vários personagens e conta histórias de vida muito próximas de nós...


O OLHO MAIS AZUL, de Toni Morrison

Um grande romance da autora norte-americana Toni Morrison, a primeira mulher negra a ganhar o Nobel de Literatura, em 1993. Que livro lindo e forte, contado pelo olhar de duas meninas negras nos EUA de meados do século passado. Partindo de situações cotidianas e familiares, a obra escancara a violência da pobreza e do racismo, que se retroalimentam.

A troca de foco entre as personagens, os flash backs, a linguagem clara e sensível, tudo isso nos faz entrar de coração numa história avassaladora, que em alguns momentos fica insuportável de ler. Nunca me esquecerei de Pecola, a menina negra que sonhava em ter o olho mais azul do mundo para conseguir ser feliz.


OS SUPRIDORES, de José Faleiro


É o primeiro romance do autor e já está entre os finalistas do Prêmio Jabuti 2021. A história, que se passa também em Porto Alegre, traz a linguagem periférica à literatura e um enredo cheio de tensão e reflexão. Aos poucos, a trama se aproxima do suspense e do gênero “policial”, de um jeito que você não consegue parar de ler.

É que os dois personagens principais trabalham como supridores num supermercado, moram na favela e ganham um salário de merda. Então resolvem mudar de vida e... ganhar muito dinheiro de uma vez. O maior passo deles em busca de uma chance nesse mundo... mas é um passo ilegal.

Alguma semelhança com a série "Breaking Bad"? Um pouco, mas essa aventura brasileira tem destinos bem diferentes. O livro não aborda abertamente questões raciais, mas elas ficam implícitas o tempo todo.

Obs: um dos personagens é bem crítico e faz a melhor explicação sobre os mecanismos da desigualdade social que já vi escrita. Muito bom!

Consegui a indicação na @livraria_paginas


ÚRSULA, de Maria Firmina dos Reis

A autora é a primeira escritora negra a ser publicada no Brasil (seu livro foi publicado em 1859). “Úrsula” é provavelmente também o primeiro romance nacional abertamente abolicionista. Maria Firmina era pobre, professora, filha de mãe e pai negros e não casados, foi criada pela mãe e pela tia no interior do Maranhão - a história dela dá outro livro de tão interessante (esse livro já existe).

O romance tem um enredo ultra-romântico, típico da época. Mas não é o romantismo dos salões e do final de novela. Tem muitas coisas a mais: o cenário do sertão nordestino, a injustiça social, o patriarcado, a escravidão.

Talvez pela primeira vez na literatura brasileira dois escravizados tiveram voz: Túlio e Mãe Suzana, que participam da história e questionam a todo tempo sua condição. Lógico que precisamos ler entendendo o contexto da época e seus limites. A discussão abolicionista e feminina aparecem no romance, mas de forma muito diferente do que estamos acostumados, vinculadas a uma forte religiosidade (algo que está presente em todo o Romantismo mundial). Diante disso, Maria Firmina dos Reis construiu um romance violento e com forte conteúdo social. Uma pioneira no seu tempo.


POEMAS DA RECORDAÇÃO E OUTROS MOVIMENTOS, de Conceição Evaristo

Claro que a escritora e poeta mineira teria que entrar nas minhas sugestões. Não por formalidade ou pelo fato de ela ser um nome mais reconhecido atualmente. É que sou apaixonada por esse que foi seu primeiro livro poesia publicado, uma coleção de  poemas maravilhosos, entremeados de breves prosas poéticas com memórias de infância e, especialmente, de sua mãe.

Os poemas falam sobre negritude, raízes, feminilidade, amor, dor. Alguns são mais íntimos e pessoais, outros trazem maior crítica social. Tirei desse livro os versos que iniciam este post.



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